domingo, 31 de agosto de 2014

Sobre a vaca e o voto

Chegávamos do trabalho quando nos deparamos com uma cena inusitada: uma vaca (animal mesmo) escarafunchava o nosso lixo.

Seguimos com o carro em sua direção e buzinamos na esperança de contê-la, mas ela continuou firme em seu propósito de abrir o saco e se esbaldar com tantos detritos.

O que para nós era desprezível, para ela era desejável.

Restos de comida, embalagens, itens fora da validade, poeira. "O que essa vaca tem na cabeça pra se interessar por tanta porcaria?!"

Como não conseguimos afastá-la, entramos em casa, fechamos o portão e ela ficou à vontade, fazendo a festa.

"Por que o carro de lixo passa apenas três vezes por semana?"

Eu, a racional da história, tentei seguir a rotina, indiferente à bagunça do animal, mas vez por outra a criatura e a obra-prima que ela certamente fizera em frente a casa apareciam em minha mente.

“Ah... Nem tenho culpa. Amanhã o caminhão de lixo passa e diminui a confusão”.

Fiquei com esses pensamentos evasivos até me conscientizar de vez: “O lixo da minha casa é minha responsabilidade.”

Essa relação público/privado é sempre complicada.

Saí de vassoura e pá em mãos para arrumar a bagunça da vaca (pra não dizer minha).

Eu já estava preparada para o pior: pedaços do lixo espalhados por toda a rua... Qual não foi minha surpresa (e alívio) quando Lívio gritou: ela não conseguiu abrir o saco!

Ufa!

Recolocamos o saco no depósito do lixo e fim. Tudo voltou à ordem.
...

Essa semana alguém me contou que uma amiga pediu que ela votasse no deputado Fulano de Tal, pois se Fulano de Tal ganhasse, ela poderia procurá-lo em seu gabinete e ele concederia o que ela precisasse.

Uma promessa dessas anima qualquer um em um primeiro momento. Mas vantagens pessoais põem em cheque benefícios em prol de toda a comunidade. Os serviços devem contemplar a sociedade indistintamente, não são (ao menos não deveriam ser) moedas de troca para adquirir votos. Quem faz propostas assim em busca de eleitores já revela que, ao menos, uma coisa lhe falta: ética.

De que adianta ganhar um milheiro de tijolos para sua casa e sofrer com falta de saneamento básico, iluminação pública, empregos, escolas, segurança?!

Voltando a minha história...

De que adianta ter a casa limpa e a rua repleta de sujeira?

Por que sempre temos que colocar a culpa na primeira vaca da esquina? Por que queremos nos livrar de nossas próprias responsabilidades? Por que primamos tanto por nosso conforto mesmo que em detrimento de toda a comunidade?

Corrupção gera corrupção. Egoísmo gera uma nação miserável.

quarta-feira, 27 de agosto de 2014

Terra firme

Não tínhamos um mês de namoro, quando Lívio assistiu a uma cena, não fosse cômica, trágica.

Ele esperava em frente ao prédio de meus pais e me observava enquanto eu descia a escadaria. De repente, a namorada que atravessava, elegante e rapidamente, cada degrau, tornou-se algo parecido com um saco de batatas rolando.

É, eu caí feio. Logo estava de quatro diante da pessoa que eu mais temia decepcionar naquele momento.

Se por um lado foi ruim sofrer as dores da queda e o dano na imagem até então preservada; por outro tivemos a oportunidade de bem cedo vivermos uma cena real. Sem enfeites ou máscaras, eu estava ali estatelada no chão.

Se algo estava sob controle, ali saiu completamente. Ele pode me ver como sou, bem diferente daquela garota jeitosa, que minutos atrás iniciara a descida da escada como uma pluma, sem olhar os degraus.

Muita gente prefere andar a vida toda como pluma a ser quem realmente é. Relacionamentos são construídos com base em mentiras e seguem sem consistência sobre estruturas ocas. Mas o vazio aparece. Muitas vezes tarde demais. A estrutura cede e não há mais tempo para se salvar.

É claro que por um bom tempo não vi nada bom daquele episódio sinistro. Eu só pensava no grande mico e nas minhas dores. Hoje colho as lições.

A primeira: olhar bem por onde pisa e, antes de seguir, atentar para o conselho do apóstolo Paulo:

"Assim, aquele que julga estar firme, cuide-se para que não caia!”1 Coríntios 10:12

Segundo: devemos construir a vida e os relacionamentos sobre terrenos sólidos, seguros. Por mais que a exposição de alguns assuntos delicados sobre nós ou nossa família possa trazer sofrimentos ou constrangimentos em um primeiro momento, a verdade é sempre a melhor opção.

A vida real deve ser encarada. Não vivemos no mundo cinematográfico. Sentimos dor de barriga e, na maioria das vezes, não temos o cheiro daquele maravilhoso perfume francês.

O desafio não é parecer perfeita para conquistar quem amamos, mas ser amada pelo que somos, ainda que estejamos bem distantes de qualquer modelo ideal.

Deus nos ajude!

domingo, 17 de agosto de 2014

Sobre meus irmãos

Hoje, meu irmão mais velho, Andrey, faz 30 anos.

Não podemos deixar de louvar a Deus por sua vida nestas três décadas. Jovem trabalhador, esposo dedicado, pai de duas garotinhas amáveis.

Obrigada, Senhor, pela vida de meu irmão. Que cada dia ele cresça na graça e no conhecimento do teu Filho Jesus!
...

Essa data me fez lembrar os anos que passamos juntos em família. Na convivência fraterna e no elo entre irmãos.

Nossa diferença de idade é bem pequena. Quando Andrey tinha dois anos e quatro meses, meus pais já tinham acrescentado à prole eu (um ano e dois meses) e minha irmã recém-nascida, Natasha. (Conto esse fato pra todo mundo).

Isso certamente foi um fator que contribuiu para que crescêssemos tão próximos, unidos, apesar de tantas diferenças.

Andrey é o mais aventureiro, destemido e engraçado. Normalmente é o quebra gelo da família e facilmente conquista espaços com sua espontaneidade e divertimento.

Natasha é mais dinâmica, resolvida e aparelhada. É ela quem organiza os eventos de família, planeja viagens e resolve as questões práticas com desenvoltura e rapidez.

Eu os admiro, por serem hábeis em tantas coisas. Por isso sempre conto orgulhosa sobre seus feitos.

Eu queria fazer tranças como a minha irmã e andar a cavalo como o meu irmão, mas minha coordenação motora não é lá essas coisas e minha destreza pior ainda.

Andrey, aos cinco anos de idade, assistiu a morte de uma criança, vítima de um abalroamento. Natasha, assim que tirou a carteira de motorista, distraiu-se com uma vitrine de roupas e acabou batendo o carro numa pick-up, que levou metade do seu carro. E pergunta qual deles não dirige?! Eu. Rsrs

Eles normalmente são mais resolvidos e adiantados do que eu. Namoraram, casaram, tiveram filho, tudo antes de mim.

Admiro-os em muitas coisas, mas há também pontos em que divergimos. Não é à toa que, quando crianças, eu e minha irmã vez ou outra nos estapeávamos e meu irmão seguia com atividades que não me empolgavam nem um pouco: ele sempre adorou desafios no mato e brincadeiras mais pesadas. Sem contar que, algumas vezes, unia-se aos primos para destruir minhas bonecas. Imaginem o quanto isso me fez chorar.

A verdade é que eles estiveram presentes nos grandes momentos de minha vida, foram os primeiros com quem aprendi sobre compartilhamento e amizade. Alegraram-me, inspiraram-me, irritaram-me (às vezes, rsrs). Enfim, com eles pude entender a preciosidade que é ter uma família e as nuances do amor.

Hoje somos os três crescidos, vividos, casados e espero seguirmos juntos, lado a lado, louvando ao Deus que nos criou, vivenciado cada momento com nossos cônjuges, acompanhando nossos pais e filhos e todas as histórias que ainda vão desenrolar.

Amo vocês sempre!

domingo, 10 de agosto de 2014

Padrão pai

Alguém comentou que ainda tinha que comprar o presente do dia dos pais.

Eu lhe disse que dessa vez nem estava preocupada com presentes, pois só veria meus pais (Raimundo e Josué) nas próximas semanas e meu marido ainda nem era pai...

Se bem que o Lívio já é um projeto e tanto!

Ele não tem lá aquele jeito com criança, mas como um bom pai já elege os melhores pensamentos sobre os rebentos.

Vez por outra se refere aos nossos filhos e tenta me convencer sobre os nomes que lhes daremos, falando sobre a história e o significado daquele preferido, sempre relacionado a louvor, força, coragem.

Ontem, no almoço, ele comentava sobre uma garotinha que estava pedindo à mãe para brincar mais um pouquinho no parque do restaurante. E confidenciou que se fosse sua filha não resistiria àquele pedido tão faceiro.

A partir daí iniciamos uma conversa sobre que tipo de pai ele seria. Conclui que fará o perfil durão, mas amigo. Penso que não vá ser manteiga derretida, mas torcerá e estará presente em cada uma das realizações dos pequenos.

Mas isso são apenas cogitações. Na vida real, no corre-corre do dia-a-dia, na saúde e na doença, na escola e no parque, nas conversas e no silêncio, nas brincadeiras e na disciplina é que se faz um pai.

Cada fase vai mostrando devagarzinho uma a uma de suas facetas e ensinando, adaptando, até ele se tornar um ser único, com costumes e regras próprias.

A gente erra por querer colocar todos os pais no mesmo modelo, numa caixa fechada de qualidades e reações, como se tivessem que se encaixar em um molde antigo e falho.

Meu pai tinha quase trinta e quatro quando ganhou seu primogênito. Aos poucos ele foi se mostrando um pai rígido, mas muito companheiro, daqueles que nos fazia dormir contando histórias e que não desgrudava de nosso pé quando estávamos doentes.

E nós o amamos do jeito que ele é, mesmo que muitas vezes não concordássemos com alguma decisão sua.

Até a barba dele se tornou um pedaço indispensável. Desde que nos entendemos por gente o conhecemos com aquela penugem na face.
Éramos pequenos, quando em um passeio para o litoral, ele resolveu tirá-la. Qual não foi nosso espanto, ao acordar e dar de cara com aquele homem estranho. Sem barba ele não era nosso pai, choramos diante daquele ser estranho.

Queríamos nosso pai do mesmo jeito de sempre, sem tirar nem por nada.

O pai, normalmente, é o responsável pela maioria das culturas familiares. Na minha, ele que estabeleceu os almoços na hora certa, independente de quem tinha chegado; a televisão desligada durante a tarde; a proibição do Big Brother; os domingos na igreja; o respeito à palavra dada; o gosto pela vida simples do campo e pela leitura.

Um dia verei meu marido levantando-se como um pai igualmente único.

Espero em Deus vê-lo desenvolvendo uma cumplicidade exclusiva com as crianças e um jeito próprio de se entender e se amar.

Não vou ficar com ciúmes, afinal sei quanta diferença faz o pai em um lar.

Quem sabe próximo ano a gente já comece a contemplar isso... Mas aí já é outra história...

Feliz dia dos pais! Deus os abençoe!